Economia

Agenda ESG reúne o criador do conceito e especialistas na Findes

Reduzir o impacto ambiental das empresas e promover práticas sociais e de governança mais responsáveis. A Agenda ESG (Environmental, Social and Governance) tem se consolidado como um importante indicador na avaliação de diversas organizações ao redor do mundo, sejam do setor produtivo, de governos ou do terceiro setor.

 

O seminário “Agenda ESG: Desafios, Segurança Jurídica, Inovação e Oportunidades”, que aconteceu nesta sexta-feira, 1º de setembro, no auditório da Federação das Indústrias do Espírito Santo (Findes), reuniu lideranças de diferentes setores. O evento é uma realização da Findes em parceria com a Polícia Federal no Espírito Santo, com o apoio de Escola Nacional de Perícias, Allemand Consultoria e Advocacia Empresarial, Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-ES), ES em Ação e Governo do Estado do Espírito Santo.

De acordo com a presidente da Findes, Cris Samorini, a sigla ESG se integra cada vez mais ao dia a dia das empresas. Seja nas pautas ambientais, sociais ou de governança, ela é fundamental para garantir a sustentabilidade dos negócios e das organizações a longo prazo. 

“Temos indústrias que são exemplos nas pautas sociais e ambientais, pois já integram muitas práticas da Agenda ESG em seus negócios para minimizar impactos, conquistar confiança do mercado e estar mais bem preparadas para enfrentar os desafios de um mundo em constante transformação. Além disso, a pauta ESG não apenas impulsiona a ética nos negócios, mas também catalisa a inovação, atrai investidores comprometidos com a sustentabilidade e posiciona nossas indústrias de forma competitiva em uma economia cada vez mais consciente e orientada por valores.”

Durante a abertura do Seminário, o governador Renato Casagrande disse que o país está vivenciando uma oportunidade com a transição energética e que, economicamente, é um importante caminho para o Estado também. 

“O mundo precisa de novas fontes de energia renovável para salvar o planeta. Somos um país produtor de alimentos, mas também temos chances de ser o maior fornecedor de energia limpa para o mundo. Neste caminho, o Estado está desenvolvendo o Plano de Neutralidade de Carbono, e contamos com as federações do setor produtivo para aprimorar as ações.”

O chefe do executivo estadual encerrou sua fala destacando que o tema ESG é um compromisso das empresas, das pessoas jurídicas e de cada um de forma individual. 

À frente da superintendência da PF no Estado, Eugênio Ricas salientou que a agenda ESG traz um tema que agrega muito à iniciativa privada e ninguém melhor que a Findes para fazer essa parceria na realização de um evento tão relevante no Estado. 

“O ES está saindo na frente de muitos estados do Brasil ao realizar um seminário com um tema e palestrantes tão relevantes. Se não abraçarmos a cultura ESG e os problemas que são gerados, as próximas gerações estarão com o futuro ameaçado. Este é um momento para entrar na história.”

O representante da OAB no evento, Marcos Pereira, agradeceu a oportunidade de a instituição apoiar o seminário de ESG e destacou que a organização está sempre à disposição para ser uma fonte de diálogo entre os Poderes.  

A Polícia Federal também apresentou inovações no Programa Brasil Mais, que acaba de incorporar um módulo ESG, lançado esta semana, no evento Interforensics. A primeira funcionalidade do módulo é a emissão de relatório de conformidade socioambiental. 

O surgimento do termo ESG

 

Pela primeira vez no Espírito Santo, Paul Clements-Hunt, ex-chefe da Iniciativa Financeira do Programa Ambiental da ONU, equipe que cunhou o termo ESG, apresentou a palestra “ESG – A história do acrônimo que mudou o mundo dos investimentos sustentáveis”. Segundo ele, o conceito surgiu dentro de um jovem time de pessoas na Organização das Nações Unidas (ONU), entendendo que era necessário conversar com o sistema financeiro para que a riqueza gerada com os negócios chegasse à sociedade, era preciso criar uma estrutura de investimento sustentável, pensando nas comunidades, com transparência e governança.

“Ao longo dos anos, os investimentos foram se avolumando e crescendo no mundo. A Agenda ESG, hoje, está no sistema financeiro com muita força. São muitos os atores atuando, com governos, indústrias, organizações. Temos um mercado multitrilionário, com grandes possibilidades de investimento. E esses investidores estão em busca de projetos sustentáveis e viáveis onde possam aportar seus recursos. Aí estão oportunidades para o Brasil e o Espírito Santo”, afirmou o especialista.

Em 2006, quando o Princípios para Investimento Responsável (PRI) foi lançado, contava com 63 signatários, representando mais de US$ 6,5 trilhões em ativos. Atualmente, são mais de 3,9 mil instituições, representando mais de US$ 121 trilhões em ativos, criando oportunidades para que as indústrias possam buscar negócios mais resilientes, que alinhem a geração de valor econômico em longo prazo e benefícios para a sociedade.   

Com intervenções de Maria Helena Vargas, coordenadora da Jornada ESG Rede Gazeta e idealizadora do Prêmio Biguá de Sustentabilidade, Paul Clements-Hunt disse ainda que é fundamental a colaboração entre políticos, empresários, e investidores, além de ter a visão de que é possível elaborar projetos menores, mas de impacto. 

“Precisamos ser criativos, pensar produtos, plataformas, sistemas, recriar o fluxo do dinheiro no sistema, reimaginar o sistema financeiro. Trabalhar em conjunto, de forma integrada, tendo financiamento, tecnologia e a participação da sociedade. Precisamos de centenas de encontros como esse ao redor do mundo”, frisou.

 

Painéis e debates

No evento, eles puderam compartilhar boas prática em ESG, desafios do novo ambiente regulatório e legal, assim como compreender de que forma a integração entre o poder público e setor privado pode ajudar a criar um ambiente de segurança jurídica para o desenvolvimento de negócios sustentáveis, gerando impacto positivo para as empresas e para a sociedade. 

Desde a promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, a ordem econômica está fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, comprometida a assegurar a existência digna para todos, mediante a observância dos princípios da defesa do consumidor, defesa do meio ambiente, bem como da redução das desigualdades regionais e sociais.

A transparência e o controle governamentais estão interligados. A transparência fornece as informações necessárias para que o governo avalie e fiscalize o cumprimento das regulamentações, e o controle governamental aumenta a eficácia da transparência, garantindo que as informações divulgadas sejam precisas e confiáveis.

Enquanto o secretário de Estado de Controle e Transparência, Edmar Camata, frisou que a agenda ESG não é possível de alocar em um único setor. “É preciso envolver todos os setores das organizações, uma formação público-privada do tema, com a maturidade necessária. O ESG não é governamental, estamos falando de uma evolução do mundo. Enquanto a adoção dessa agenda ainda é uma opção e não uma obrigação, precisamos criar marcos, fomentar projetos com aptidão ESG”.

 

Agências governamentais têm a responsabilidade de criar e aplicar regulamentações ESG. As Comissões de Valores Mobiliários (CVMs) desempenham um papel significativo na promoção da pauta ESG nos mercados financeiros. Inspetor do NPLD-FTP na Superintendência Geral da CVM, Marcus Vinicius de Carvalho levou ao debate que já há uma diretriz internacional que aponta para a implementação de práticas que levem as empresas a terem que publicar relatórios de sustentabilidade.

“O importante é ter a transparência. As autoridades do mercado financeiro estão preocupadas com informação precisa e segura. O ESG hoje é um fato econômico. Se os empresários não compreenderem isso, eles terão dificuldades de entrar no mercado financeiro. Cabe às autoridades competentes estarem atentas se aquilo que está sendo divulgado pelas organizações, de fato, corresponde à realidade”, afirmou.

Inovação

A integração da pauta ESG no terceiro setor, que inclui organizações sem fins lucrativos, ONGs e outras entidades, apresenta desafios específicos e oportunidades de inovação. Referência na área social e CEO do Instituto Das Pretas, a empreendedora Priscila Gama reforçou que o grande desafio é, de fato, integrar e fazer junto.

“Tudo começa pelo S, pelo social, cultura é sobre pessoas. É preciso reculturar as pessoas para a agenda ESG. O nosso desafio com o laboratório de inovação e tecnologia social que trabalha com população negra, indígena e de vulnerabilidade é ser entendido como competência técnica para desenhar junto as estratégias. Quais são as parcerias que estão absorvendo as tecnologias feitas pelos corpos periféricos? Os negócios sociais desafiam pilares tradicionais do fazer comercial e fazem a gente enxergar que não temos só um modelo de negócio. Dá pra fazer sustentabilidade e ter riquezas devidamente distribuídas, fazer compliance de gênero, de raça. O Brasil ainda acha que o S é fazer filantropia”, ressaltou.

À frente da pasta de Meio Ambiente e Recursos Hídricos do Governo do Estado, o secretário Felipe Rigoni pontuou que só se constrói uma agenda coerente ouvindo as várias visões e os atores envolvidos no processo, entendendo a urgência, a viabilidade e o caminho correto para se chegar aos resultados desejados.

“Temos exercido um papel de tentar fazer essa grande convergência em torno do tema. Em junho, lançamos a primeira versão do nosso plano de descarbonização. A segunda versão deve estar pronta no primeiro semestre do ano que vem. Isso implicará uma série de estratégias do poder público e privado. Os caminhos são diversos: hidrogênio verde, biogás, energia eólica e outros. Um potencial nosso é fomentar os negócios sustentáveis e de impacto socioambiental, que têm como modelo o lucro atrelado à sustentabilidade. O que precisamos é pensar em como ganhar dinheiro a partir de serviços ambientais, buscar soluções e projetos que trabalhem a sustentabilidade. A nossa função é acelerar esses projetos”, detalhou.

  

Risk Advisory Senior Manager da KPMG e cofundadora do Compliance Women Committee, a advogada Juliana Nascimento chamou a atenção para o aspecto da governança dentro das organizações.

“O principal ponto, dentro de ESG, é falar de integridade e transparência das organizações para que se possa ter clareza nas ações. É preciso ter o G da governança muito bem consolidado. Cerca de 71% dos conselheiros no mundo apontam que o tema é relevante, mas somente 33% dos entrevistados disseram ter estrutura apropriada dentro da instituição. Como conduzir essas práticas na alta administração? Precisamos de mudança organizacional para que isso possa acontecer, ter um defensor dessa agenda dentro da administração. A reputação está colocada em pauta e isso impacta diretamente nessa discussão”, avaliou.

Oportunidades

As indústrias já estão conectadas à Agenda ESG e vêm adotando medidas e desenvolvendo ações que impactam diretamente em seus negócios. João Bosco Reis, diretor de Sustentabilidade e Relações Institucionais da ArcelorMittal, destacou que o setor do aço tem uma norma internacional, que cobra 14 quesitos. A planta no Espírito Santo é a primeira, nas Américas, certificada na norma ESG entre as indústrias do setor.

“A questão de sustentabilidade na ArcelorMittal é vista em seis dimensões, inserindo também o político, o cultural e o espiritual. Nós somos a sociedade, esse trabalho em rede é essencial. Espiritualidade são os valores essenciais da empresa. As ações estão guiadas dentro do propósito do negócio. Nas 14 comunidades onde estamos inseridos, criamos uma forma de transformar a realidade das associações de moradores, demos as condições para que elas estivessem em conformidade com a legislação e as práticas da empresa para que possam ser apoiadas por linhas de investimentos nossos”, exemplificou.

 

Na agenda ambiental, Reis destacou a agenda hídrica interna da ArcelorMittal, com um índice de reuso de 98% de água doce, além de alcançar 96% da água utilizada pela indústria a partir do processo de dessalinização da água do mar. Outro ponto de destaque foi o investimento em educação. “Temos um orgulho muito grande da parceria que temos com o Sesi. A equipe dos Pocadores faz parte de um projeto de Fórmula 1 nas escolas, eles são a melhor equipe brasileira dentro dessa competição internacional”, destacou.

No setor energético, Eduarda Lacerda, gerente geral da Unidade Vitória da Petrobras, apresentou o portfólio da empresa que completa 70 anos de atuação no mercado em 2023. De acordo com dados da petrolífera, nos últimos 11 anos, houve uma redução de cerca de 50% nas emissões de carbono.

“Em ambiental, mudamos a política de descomissionamento de plataformas, fazendo o acompanhamento do que será feito com o material proveniente desse processo. A vencedora da licitação da P-32, por exemplo, utilizará a sucata metálica em seu processo de produção. Outro exemplo, a Maria Quitéria será a primeira plataforma com sistemas totalmente eletrificados que entrará em operação, em 2025, no campo de Jubarte, no pré-sal da bacia de Campos. No social, são 11 projetos da Petrobras no Espírito Santo. Entendemos que o S é o que dá a liga ao ESG, são as pessoas que vão promover as mudanças ambientais e de governança. Entendemos que o Brasil, em toda a nossa diversidade e com todo o nosso potencial, é a nossa energia”, frisou.

 

No cenário das micro, pequenas e médias empresas, Carlos Eduardo Santiago, gerente adjunto de Competitividade do Sebrae, mostrou que a Agenda ESG ainda é um desafio. “É muito satisfatório estarmos nesse painel. Não temos como voltar atrás, precisamos direcionar o nosso público para a Agenda ESG. As pequenas empresas de mercados corporativos estão mais dentro dessa realidade, conseguimos pautar essa temática com a cadeia de fornecedores. Com a expertise do mercado, práticas de relatórios e certificação de ESG, montamos uma trilha para o pequeno negócio, a partir de autoavaliação, fazendo o diagnóstico do que há a melhorar, pautado em 18 itens de ESG”, enfatizou.

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