Artigo

ARTIGO – Pouca vergonha

A Organização das Nações Unidas é uma instituição voltada aos mais nobres fins. Depreende-se que quem nela trabalhe seja parte de uma fina elite. Pois é: e li que uma a cada três de suas funcionárias enfrenta assédio sexual no ambiente de trabalho!

O Parlamento do Reino Unido é uma vetusta instituição, abrigada em um dos mais belos prédios do mundo. Dia desses fui informado, por um sério jornal britânico, ter recente inquérito constatado que “suas funcionárias tem sido inadequadamente tocadas e abusadas verbalmente em uma insidiosa e perversa cultura de assédio”. Algumas das vítimas relataram que certos parlamentares do sexo masculino comportam-se desta maneira “quase diariamente”.

A imprensa deste planeta é uma instituição nobre. Nela repousam as esperanças da humanidade pelo desenvolvimento moral de governos e povos, fruto da transparência que somente ela poderá proporcionar. Enquanto isso, dois terços das jornalistas experimentam assédio sexual no ambiente de trabalho!

As universidades norte-americanas são uma das referências deste planeta, seja pelo alto nível acadêmico ou pela riqueza de recursos. Surpreende, assim, ter sido divulgado pelo governo daquele país que nelas 20% das estudantes são vítimas de abuso sexual.

As prisões deste planeta não são apenas repositórios de gente – lá estão guardadas, também, as esperanças da humanidade pela ressocialização de muitos. Os que nela atuam devem, pois, compor uma elite preparada e consciente. Surpreende, assim, que 84% das presas espanholas sofram maus tratos físicos e sejam sexualmente abusadas.

O mundo das leis é, talvez, a esperança última das pessoas. Nele estão alguns dos profissionais mais preparados – cultural e filosoficamente – que a sociedade forjou. E eis que 700 deles, por escrito, pediram ao presidente da Suprema Corte norte-americana que combatesse o assédio sexual que macula os juizados daquele país.

Diante de todos estes casos, reflita por um instante: eles acontecem no interior de órgãos os mais importantes e são praticados por representantes da “elite das elites”. Alguém diria que este triste quadro é universal. Pode ser. Mas, como ensina sábia reflexão vietnamita, “os vazamentos sempre começam no telhado” – daí a importância do exemplo. É quando só nos resta dizer: que pouca vergonha…

Pedro Valls Feu Rosa é jornalista, escritor e desembargador no Espírito Santo

Leia também