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Municípios capixabas usam manobra contábil nos pagamento do piso dos professores

MPF notifica 59 cidades por descumprimento da Lei do Piso Nacional; Tribunal de Contas já considera prática irregular

Uma prática ilegal e recorrente está no centro da recente notificação feita pelo Ministério Público Federal (MPF) a 59 municípios do Espírito Santo: o não pagamento do piso salarial nacional do magistério. A denúncia escancara o uso de manobras contábeis por prefeitos para mascarar o descumprimento da legislação.

De acordo com o advogado Amarildo Santos, especialista em Direito do Magistério e Direito Público, muitos gestores afirmam pagar o piso, mas o fazem somando ao vencimento base gratificações que o professor já recebe por direito, como adicional por tempo de serviço ou por titulação.

“A Lei 11.738/2008 é clara ao determinar que o piso deve incidir apenas sobre o vencimento básico, sem considerar gratificações”, afirma Amarildo. “Essa conduta viola a essência da lei e já foi considerada irregular pelo Tribunal de Contas do Estado do Espírito Santo (TCES), no Processo 00585/2024-1”.

A prática, segundo o advogado, compromete a valorização da carreira docente. “Quando o vencimento base é desrespeitado, um professor com mestrado pode receber praticamente o mesmo que um colega com apenas graduação. Isso desestimula a qualificação e fere o princípio da valorização profissional”, explica.

Além da manipulação contábil, Amarildo aponta outro problema frequente: o atraso na aplicação do novo valor do piso, que, segundo portaria do Ministério da Educação, deve vigorar a partir de janeiro de cada ano. “Muitos municípios só atualizam os valores meses depois, sem pagar os retroativos devidos. Isso representa um prejuízo direto ao professor e gera passivos judiciais para o município”, alerta.

Para o especialista, tratar o piso como uma despesa opcional é um erro grave de gestão. “O piso nacional é uma conquista histórica da categoria. Recebê-lo de forma integral não é um favor: é um direito. Os municípios precisam se adequar, sob pena de responderem judicialmente e sofrerem sanções futuras”, conclui.

A notificação do MPF pode ser o primeiro passo para corrigir uma distorção que há anos compromete a dignidade dos profissionais da educação e o futuro da educação pública nos municípios capixabas.

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