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”Estratégia, muitas vezes, é sobre aquilo que você não faz e a sua capacidade de não perder a narrativa”, diz Lucas Rezende

Lucas Rezende é Especialista em Gestão de Reputação e Gerenciamento de Crises, o consultor em comunicação Lucas Rezende, diretor da LR Comunicação

O que Roberto Carlos, Maria Bethânia, a Apple e a Dolce & Gabanna têm em comum? Estratégias bem claras e definidas. Suas narrativas e posicionamentos são tão claros e perenes que qualquer um leigo consegue descrevê-las numa folha de papel. Bethânia decidiu pela reclusão, por cantar descalça, abandonar os pentes e deixar apenas sua voz falar por si. Deu tão certo que ganhou a alcunha de “Abelha-Rainha” e foi enredo da Mangueira. Roberto decidiu assumir o TOC, negar tudo que não seja azul e branco, virar a marca-registrada do Natal brasileiro e criou uma tradição com rosas vermelhas. Resultado: virou Rei. A Apple, por sua vez, não abaixa o preço e cria produtos de designs únicos – porque criou uma marca de valor. É campeã de vendas. Já a Dolce & Gabanna optou por ser um sinônimo da “stravaganza” italiana e não entra em promoção. Deu no que deu.

Especialista em Gestão de Reputação e Gerenciamento de Crises, o consultor em comunicação Lucas Rezende, diretor da LR Comunicação, é tácito: “A estratégia é feita de escolhas”. “Muitas vezes, é sobre aquilo que você não faz. Com o tipo de internauta que você não vai conversar. Com o tipo de cliente para o qual você não vai vender. É sobre a entrevista que você recusa, pela nota de resposta que você não emite ou pelo debate que você não participa. Parece inércia, mas é esperteza. Assim como estratégia também é você ter um caminho claro, delineado, e perene. É como remédio: se você parar de tomar, não vai fazer efeito. E nenhum médico fica trocando sua receita de mês em mês, né? Ou é como numa road trip, se você muda o percurso, certamente você não chegará ao destino da mesma forma. Estratégia e posicionamento também são assim”.

Para Rezende, CNPJs e CPFs sem foco de estratégia acabam andando em círculos. “É preciso fazer escolhas para se apegar a elas. Ao abrir mão do que você não quer, você consegue ter uma maior clareza inclusive no vocabulário que será utilizado, no design gráfico exposto, e no conteúdo que será pensado. O Baile Voador, por exemplo, tem uma clara escolha com quem ele quer falar. E isso faz dele a maior festa de Carnaval do Espírito Santo, traduzindo sua escolha para o copyright, para o line-up e para suas regras de convívio. O Roda de Boteco idem: ele tem mensagens e ideais bem definidos. Isso faz dele o maior festival gastronômico que nós temos, porque essa escolha se reflete desde os influenciadores escolhidos até o seu feed no Instagram”, prossegue. Isso, segundo Rezende, faz com que a comunicação com o público-alvo seja mais assertiva. “São dois festivais, por exemplo, que tem fãs. Pessoas que aguardam com muito carinho sua chegada”, completa.

Para tanto, também é preciso coesão de narrativa. “Se você abordar um botafoguense na fila da padaria e começar a elogiar o trabalho do Gabigol, certamente essa conversa só será agradável para um dos lados. O que eu quero dizer com isso: que você precisa dar ao consumidor aquilo que ele minimamente espera. Uma vez decidido com quem você não quer dialogar, é preciso manter a conversa com quem ficou em alto nível. A campanha vitoriosa da deputada estadual Janete de Sá, por exemplo, recebeu uma roteirização audiovisual que conversava de forma profunda e direta com o eleitor em potencial naquele momento: as mulheres, a população incomodada com os maus tratos aos animais, o eleitor tradicional e que gostaria de continuar apostando na tradição; e o morador interiorano, que esperava ver uma mulher forte e trabalhadora; como eles. O sexto mandato, como se vê chegou”.

E, por fim, Rezende vaticina: “Uma boa estratégia é ser diferente. Se a sua diferença é algo comum, que seja. Nem sempre pensar fora da caixa vai ser a melhor opção mesmo. Foque no seu diferente e transforme ele numa potência. Na campanha de Rose de Freitas para o Senado, por exemplo, batemos, insistentemente, na mensagem de que ela era a candidata mais trabalhadora e que mais tinha currículo e benfeitorias para mostrar. Essa era a grande diferença dela. A olho nu, um assunto corriqueiro de campanha. Naquele contexto, marcou um diferencial. O efeito bolsonarista foi maior? Foi. Mas largamos com uma candidata aos 22% na primeira pesquisa do Ipec e chegamos ao domingo com 38,17%. O oponente venceu por três por cento a mais, apenas”, finaliza.

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