Saúde

Entrega voluntária ainda é pouco conhecida e ES registra novo caso de abandono

Entrega voluntária de bebês ainda é pouco conhecida e casos de abandono seguem preocupando no Espírito Santo

A entrega voluntária de recém-nascidos, prevista em lei desde 2017, tem como objetivo oferecer uma alternativa segura e legal para mães que, por diferentes motivos, não podem ou não desejam ficar com seus filhos. Entretanto, a falta de informação sobre o processo ainda contribui para casos de abandono, como o ocorrido recentemente em São Mateus, no Norte do Estado.

Na última terça-feira, uma recém-nascida foi encontrada em uma área rural da cidade. A situação da bebê chamou a atenção: ela estava sem roupas, coberta de terra e próxima a um formigueiro. A criança recebeu atendimento médico imediato e segue hospitalizada.

Segundo profissionais que atuam na rede de proteção à infância, cada caso possui um contexto particular. Um conselheiro tutelar com mais de dez anos de atuação explica que os motivos mais comuns para a mãe abrir mão do filho envolvem vulnerabilidade social ou histórico de violência.
“Muitas mulheres acabam associando a violência que sofreram à criança e, por isso, rejeitam o bebê”, comenta.

Uma psicóloga destaca que, apesar de muitas mães enfrentarem sentimentos de culpa e remorso, há situações em que isso não ocorre.
“Existem transtornos mentais que impedem a pessoa de sentir remorso. Para algumas mulheres, o bebê pode ser visto quase como um objeto, e não como um ser humano, o que dificulta o vínculo”, explica.

O abandono de incapaz é crime. De acordo com a Polícia Civil, a pena pode chegar a 12 anos de prisão, dependendo das circunstâncias.
“O abandono simples pode levar a até três anos. Se houver lesão corporal, a punição aumenta para cinco anos. Em caso de morte, a pena pode chegar a 12 anos”, afirma um delegado.

Para evitar tragédias e garantir proteção aos recém-nascidos, a legislação permite que mães realizem a entrega voluntária de forma sigilosa perante a Vara da Infância e Juventude. A rede de serviços — como conselhos tutelares, unidades de saúde e maternidades — identifica casos e faz os encaminhamentos.

Ao chegar ao sistema de Justiça, a gestante ou mãe é atendida por uma equipe multidisciplinar que avalia suas condições e necessidades.
“Se a entrega ocorre por falta de recursos financeiros, são verificadas as possibilidades de apoio por meio de programas sociais. Mas existem também outras situações que podem levar à decisão”, explica uma profissional ligada ao processo.

Em muitos casos, o desejo de entrega pode mudar após o nascimento.
“Há gestantes que manifestam a intenção durante a gravidez, mas, ao verem o bebê, se arrependem. Outras acabam revelando a gestação à família, que assume a criança”, relata uma servidora da Vara da Infância.

Somente no Fórum de Linhares, dois processos de entrega voluntária foram abertos no ano passado — ambos concluídos. Em 2025, três novos processos já foram iniciados, com apenas um finalizado até agora.

A lei não permite que bebês sejam entregues a pessoas que não sejam familiares, caso a decisão da mãe não seja pela entrega formal. Com o processo legal, a adoção acontece dentro das normas, garantindo à criança o direito de crescer em um lar seguro, com amor e cuidado.

Profissionais da rede reforçam que a sociedade precisa conhecer o mecanismo da entrega voluntária para evitar novos episódios de abandono.
“É fundamental que as pessoas entendam que existe um caminho seguro, humano e legal. Informar é proteger — tanto as mães quanto os bebês”, destacam.

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