Saúde

Dezembrite: o cansaço emocional que marca o fim do ano

Enquanto dezembro costuma ser associado a celebrações, reencontros e clima festivo, para muitas pessoas o período desperta sentimentos de tristeza, ansiedade e melancolia. Popularmente chamada de “dezembrite”, essa condição não é considerada uma doença, mas uma resposta emocional comum diante das pressões, reflexões e cobranças que acompanham o encerramento de mais um ano.

De acordo com Mariana Rambaldi, coordenadora do curso de Psicologia, o fenômeno está relacionado a fatores emocionais, sociais e até biológicos. “Dezembro é um mês de balanço pessoal. As pessoas revisitam metas, conquistas e frustrações, e nem sempre o resultado dessa avaliação interna é positivo. Isso pode gerar sentimentos de arrependimento, insatisfação e a sensação de que o tempo passou rápido demais”, explica.

Além da retrospectiva individual, a psicóloga destaca a forte pressão cultural para que o fim de ano seja sinônimo de felicidade. “Existe uma expectativa social de que todos estejam felizes, comemorando e realizando grandes feitos. Quando alguém não se sente assim, surge um sentimento de inadequação”, afirma. Esse cenário se intensifica com o cansaço acumulado ao longo do ano, o estresse financeiro típico das festas e o resgate de lembranças de perdas, sejam elas afetivas, materiais ou simbólicas.

Segundo Mariana Rambaldi, alguns grupos tendem a sentir esse impacto de forma mais intensa. Entre eles estão pessoas em luto recente, aquelas que vivenciam solidão ou estão distantes da família, indivíduos com dificuldades financeiras e pessoas que já convivem com transtornos emocionais, como ansiedade e depressão. “Também observamos maior vulnerabilidade em pessoas muito autocríticas, com alto nível de exigência pessoal e profissional, que se sentem pressionadas a corresponder a um ideal de sucesso e felicidade”, completa.

Embora a “dezembrite” seja considerada uma tristeza reativa e passageira, a coordenadora alerta para sinais que merecem atenção. “Quando a tristeza se prolonga, há perda de interesse por atividades antes prazerosas, alterações no sono e no apetite, fadiga constante e pensamentos negativos recorrentes, é fundamental buscar ajuda profissional. Esses sintomas podem indicar o agravamento de quadros depressivos ou ansiosos”, ressalta.

Para atravessar melhor esse período, algumas estratégias podem ajudar, como reduzir a autocrítica, evitar comparações e ajustar expectativas. “Nem todo fim de ano precisa ser marcado por grandes festas. É possível viver esse momento com mais simplicidade, criando novas tradições ou priorizando o autocuidado”, sugere a psicóloga. Praticar atividades físicas, respeitar momentos de descanso, manter uma rotina equilibrada e buscar apoio emocional com pessoas de confiança ou com um profissional também são atitudes importantes.

O uso excessivo das redes sociais é outro fator que pode intensificar o sofrimento emocional. “No fim do ano, as redes se tornam vitrines de vidas aparentemente perfeitas. Isso gera comparações injustas, pois se compara a própria realidade, com desafios e bastidores, ao recorte idealizado do outro”, alerta Mariana. A recomendação é limitar o tempo de exposição, seguir conteúdos mais realistas e lembrar-se de que as redes não refletem a totalidade da vida das pessoas.

A coordenadora da Unesc também chama atenção para os riscos da chamada “positividade tóxica”, que impõe a obrigação de estar feliz o tempo todo. “Negar ou minimizar emoções como tristeza e cansaço gera culpa e repressão emocional. Reconhecer essas emoções como legítimas é essencial para atravessar o período de forma saudável”, afirma.

Para finalizar, a psicóloga reforça a importância da autocompaixão. “Trate-se com gentileza, estabeleça limites, valorize pequenas conquistas e mantenha vínculos afetivos reais. O fim de ano não precisa ser um espetáculo de felicidade. Ele pode ser um momento de pausa, reflexão e cuidado consigo mesmo — e isso já é suficiente.”

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