Procedimento inovador realizado por neurocirurgião da Ufes oferece nova esperança a pacientes com transtornos neuropsiquiátricos
A medicina no Espírito Santo acaba de vivenciar um marco na neurocirurgia, com a aplicação inédita de uma técnica já consagrada no tratamento de doenças neurológicas para a Síndrome de Tourette, um transtorno neuropsiquiátrico complexo. O procedimento de Estimulação Cerebral Profunda (DBS, na sigla em inglês), amplamente utilizado no tratamento de Parkinson, tremor essencial e dor crônica, foi adaptado para aliviar os sintomas de uma condição até então desafiadora de tratar de forma eficaz.
A cirurgia foi realizada pelo neurocirurgião Walter Fagundes, professor da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes). O paciente, um jovem adulto diagnosticado com Síndrome de Tourette, vivia com comportamentos repetitivos e impulsivos extremos. Sua condição havia evoluído para um quadro de agressividade severa, que chegou a levá-lo a arrancar uma grade da janela em um episódio de descontrole emocional.
Após tentativas frustradas de tratamento com medicamentos e internações, a alternativa cirúrgica foi recomendada como último recurso. A escolha recaiu sobre a técnica de DBS, que foi realizada de forma inovadora na região do hipotálamo, uma área do cérebro ligada ao controle de emoções, comportamento e funções vitais como sono, metabolismo da glicose e hidratação.
“Utilizamos a estimulação cerebral profunda no hipotálamo, uma região crítica que regula não apenas funções fisiológicas essenciais, mas também está conectada ao sistema responsável pela gestão das nossas emoções”, explica o Dr. Walter Fagundes. A cirurgia consiste na inserção de um eletrodo no cérebro do paciente, conectado a um marca-passo que fica instalado sob a pele na região do peito. O dispositivo gera impulsos elétricos para modular a atividade cerebral.
Uma das grandes vantagens dessa tecnologia é a capacidade de ajustar a estimulação de acordo com as necessidades individuais do paciente. “Através de um tablet conectado ao sistema via Bluetooth, é possível ajustar parâmetros como frequência, voltagem e comprimento de onda dos impulsos elétricos para alcançar o efeito desejado, sem causar efeitos colaterais indesejados”, detalha o neurocirurgião.
O marca-passo, que é recarregável, exige uma manutenção semanal, durando em média 10 anos. Esse controle refinado sobre os estímulos permite que os médicos ajustem o tratamento conforme a evolução do quadro do paciente, oferecendo uma resposta muito mais precisa e personalizada do que os tratamentos tradicionais.
A cirurgia representa uma grande esperança para pacientes com Síndrome de Tourette, uma condição que, muitas vezes, não é respondente aos tratamentos convencionais e pode levar a dificuldades significativas na vida cotidiana, incluindo problemas em relacionamentos e no trabalho. Com a introdução dessa técnica, a expectativa é que outros pacientes com quadros semelhantes possam ser beneficiados, trazendo um novo horizonte para o tratamento de transtornos neurológicos e neuropsiquiátricos complexos.
O sucesso da operação reforça a importância da pesquisa científica e do avanço da medicina no Espírito Santo, colocando o estado como um centro de excelência no tratamento de doenças que afetam o sistema nervoso.