As arritmias cardíacas configuram-se hoje como um dos maiores desafios da cardiologia moderna. Estima-se que até 20% da população brasileira seja afetada por algum tipo de distúrbio do ritmo cardíaco – cerca de 40 milhões de pessoas. Apenas entre 2014 e 2024, o Sistema Único de Saúde (SUS) registrou 728 mil internações relacionadas a arritmias, com mortalidade em torno de 11,6%. A fibrilação atrial, a mais frequente delas, cresce de forma exponencial com a idade, alcançando até 14% da população acima dos 80 anos, e já é considerada uma epidemia em expansão global.
Nesse cenário desafiador, o Hospital Santa Rita, em Vitória, destaca-se nacional e internacionalmente. Sob a liderança do médico arritmologista Fabricio Vassalo, o Centro Avançado de Arritmias Cardíacas da instituição – criado por meio de parceria com o Instituto do Coração – foi estruturado em compasso com os principais serviços de excelência do mundo, unindo tecnologia de ponta, assistência integral e produção científica de impacto.
O serviço não apenas atende pacientes em caráter emergencial, mas também realiza procedimentos programados com suporte de pronto-socorro e UTI exclusivos para cardiologia. Em parceria com a indústria de equipamentos médicos, o Hospital Santa Rita investe na formação de especialistas brasileiros, promovendo treinamentos e atualizações que reverberam em todo o território nacional e até em outros países da América Latina.
Um dos marcos desse protagonismo foi a adoção pioneira, no Brasil, da ablação de fibrilação atrial com alta potência e curta duração, técnica que reduziu o tempo de procedimento e aumentou a taxa de sucesso em longo prazo. A equipe, sob coordenação de Vassalo, também desenvolveu um estudo inédito em colaboração com o setor de anestesia, modificando parâmetros de ventilação durante a anestesia geral. Essa inovação otimizou ainda mais os resultados clínicos, ganhando reconhecimento internacional ao ser publicada na revista Heart Rhythm, da Sociedade Americana de Arritmia, e rapidamente adotada por outros centros dentro e fora do Brasil.
O impacto científico do grupo é notável: desde 2019, foram mais de 15 publicações em periódicos nacionais e internacionais, além de quatro prêmios nos Congressos Brasileiros de Arritmias Cardíacas. Em 2023, o trabalho que apresentou a nova técnica de ventilação recebeu o Prêmio de Melhor Pesquisa do Congresso da Sociedade Brasileira de Cardiologia, consolidando o serviço como referência nacional em inovação. O reconhecimento ultrapassou fronteiras, com trabalhos brasileiros apresentados em fóruns internacionais de prestígio, como o Simpósio Anual de Fibrilação Atrial nos Estados Unidos, em 2019 e 2020.
Esse percurso de excelência culminou na tese de doutorado defendida por Fabricio Vassalo em novembro de 2024, na Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP. A pesquisa sintetizou anos de experiência clínica e científica, reafirmando a contribuição do cardiologista capixaba para a medicina cardiovascular contemporânea.
Graças a esse trabalho, o Hospital Santa Rita posiciona-se hoje não apenas como referência no Espírito Santo, mas também como um dos polos de maior destaque em arritmias cardíacas na América Latina. “Nosso compromisso é unir ciência, inovação e cuidado humano para oferecer aos pacientes os melhores resultados possíveis”, destaca Vassalo. Em tempos em que as arritmias se consolidam como importante problema de saúde pública, iniciativas como a do Hospital Santa Rita representam esperança, excelência e liderança científica em escala internacional. Confira o bate-papo com o médico:
O que são arritmias cardíacas e quais os tipos existentes?
São alterações na formação ou condução do impulso elétrico do coração, que resultam em batimentos muito rápidos, muito lentos ou irregulares. Em condições normais, o coração bate de 60 a 100 vezes por minuto em ritmo regular. Quando há falhas no sistema elétrico cardíaco, o ritmo pode se tornar irregular, comprometendo a função de bombeamento de sangue.
Entre as Taquiarritmias – com batimentos acelerados maior do que 110 -, temos a Fibrilação Atrial (FA), que desorganiza o ritmo nos átrios e é a arritmia mais comum e aumenta o risco de AVC em até cinco vezes; a Flutter Atrial, que é semelhante à FA, mas com padrão mais regular. Temos a Taquicardia Supraventricular (TSV), que se origina nos ventrículos e pode causar palpitações súbitas e a Taquicardia Ventricular (TV), que se apresenta com ritmo rápido originado nos ventrículos e que pode evoluir para colapso circulatório. Neste grupo, há ainda a Fibrilação Ventricular (FV), que se apresenta pela atividade elétrica caótica nos ventrículos, situação de emergência que leva à morte súbita se não tratada.
Já entre as Bradiarritmias – batimento lento, menor do que 60 -, temos a sinusal, com ritmo mais lento do que o normal; e os Bloqueios Atrioventriculares (BAV), que levam ao atraso ou interrupção na condução elétrica entre átrios e ventrículos, podendo causar desmaios.
Quando as arritmias acontecem e como identificá-las?
Elas ocorrem por múltiplos fatores, entre eles doenças cardíacas estruturais, como infarto prévio, insuficiência cardíaca, cardiomiopatias, valvopatias. Por condições sistêmicas, como hipertensão, diabetes, doenças da tireoide, apneia do sono. Nesse cenário de gatilhos, entram o consumo excessivo de álcool, cafeína, drogas ilícitas e alguns medicamentos. Há síndromes genéticas que também podem desencadear as arritmias. Vale ressaltar que, em muitos casos, especialmente em jovens saudáveis, arritmias benignas podem aparecer sem doença estrutural associada.
Os sintomas variam de palpitações, tontura, desmaio, fadiga, falta de ar, dor no peito e até parada cardíaca súbita. Exames como eletrocardiograma, holter 24h, teste ergométrico e estudo eletrofisiológico são alternativas para diagnosticar a doença. Dos casos atendidos no setor de hemodinâmica do Hospital Santa Rita, os de arritmia cardíaca chegam a totalizar até 40% da demanda.
Como tratá-las?
O tratamento depende do tipo de arritmia, da gravidade e da presença de doença cardíaca associada. Medidas clínicas como controle de peso, hipertensão, apneia do sono, redução do consumo de bebidas alcoólicas e drogas estimulantes ajudam na prevenção e no tratamento. Há situações em que recomendamos o uso de medicamentos e outros que torna-se necessária a intervenção cirúrgica, como a cardioversão elétrica, ablação por cateter, implante de marca-passo e de cardiodesfibrilador. Quando a doença se apresenta de forma ainda mais grave, o tratamento imediato é a ressuscitação cardiopulmonar com desfibrilação elétrica.
Como é o cenário da doença no Brasil e no mundo?
Estudo recente do DATASUS, de janeiro de 2014 a novembro de 2024, analisou internações e óbitos por transtornos de condução e arritmias cardíacas no Brasil. A região sudeste foi a que concentrou o maior número de internações (48,3%). Dividindo por faixas etárias, a maior parte dos casos ocorreu com pacientes entre 70 e 79 anos ( 26%), seguido por 60 a 69 anos ( 22%) e acima de 80 anos ( 21%). Mais de 80% das interações se deu via atendimento de urgência/emergência – daí a necessidade da criação do Centro Avançado de Arritmias Cardíacas. Estima-se que até 2050 uma epidemia de fibrilação atrial – a mais frequente entre as pessoas – acometa cerca de 2% de toda população mundial.
Quais as tecnologias disponíveis no Centro Avançado de Arritmia Cardíaca?
Entre os recursos disponíveis no novo Centro estão o sistema de mapeamento EnSite X, o sistema de ablação por campo pulsado Farapulse e o ecocardiograma intracardíaco. O EnSite X cria um “mapa” virtual em 3D das câmaras cardíacas, integrando dados anatômicos e elétricos, permitindo que o médico visualize, em tempo real, onde estão os impulsos elétricos e como eles se propagam pelo tecido cardíaco. Ele possibilita guiar cateteres com mínima ou nenhuma exposição à radiação, beneficiando pacientes e equipe médica.
Já o sistema de ablação por campo pulsado Farapulse é uma tecnologia de última geração que se baseia no conceito de ablação por campo elétrico pulsado, um método inovador que não destrói o tecido por calor ou congelamento, mas, sim, por um fenômeno chamado eletroporação irreversível.
O ecocardiograma intracardíaco completa o arsenal tecnológico do novo Centro. O exame de imagem avançado é realizado durante procedimentos cardíacos invasivos, no qual um cateter equipado com um transdutor de ultrassom é introduzido dentro do coração – geralmente pela veia femoral – para gerar imagens em tempo real das estruturas cardíacas.