Economia

A saga do IOF continua: decisão do STF reverte queda e imposto volta a subir

A novela tributária que envolve o IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) ganhou um novo capítulo em julho com a decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), que restabeleceu os decretos do governo federal aumentando as alíquotas do imposto. A medida, que visa reforçar a arrecadação diante do desequilíbrio fiscal, reacendeu debates sobre os limites legais e políticos da utilização de tributos com função regulatória para fins de receita.

A única exceção, segundo Moraes, ficou por conta da cobrança sobre o “risco sacado” — modalidade de operação de crédito entre empresas, que permaneceu de fora do alcance da nova tributação.

Para a contadora capixaba Emanueli Cristini, especialista em consultoria tributária e benefícios fiscais, a questão teve início em maio, quando o governo federal editou uma série de decretos elevando o IOF em operações como câmbio, crédito, seguros e previdência privada do tipo VGBL. A expectativa inicial era arrecadar cerca de R$ 30 bilhões até o fim de 2025, mas a projeção foi revisada para R$ 12 bilhões ainda em 2024, diante da reação do Congresso.

Em junho, parlamentares derrubaram o decreto por ampla maioria, sob o argumento de que o IOF tem natureza regulatória e não arrecadatória. O governo, então, acionou o STF por meio de uma Ação Declaratória de Constitucionalidade. Em um primeiro momento, Moraes suspendeu a decisão do Congresso e tentou articular um consenso entre Executivo e Legislativo. Como o impasse persistiu, decidiu monocraticamente restabelecer o decreto no dia 16 de julho.

A decisão tem efeito retroativo ao dia 24 de junho — o que, na prática, faz com que os efeitos do aumento incidam desde a publicação dos decretos, em 22 de maio.

Com o restabelecimento do decreto, as novas alíquotas passaram a valer novamente. A contadora Emanueli Cristini detalha os principais pontos afetados:

  • Compras internacionais com cartão (crédito, débito e pré-pago): a alíquota saltou de 0,38% para 3,5%. “Isso afeta quem faz compras em sites como Shein, Shopee ou paga serviços digitais como Netflix, Spotify e outros em dólar”, destaca.

  • Envio de dinheiro ao exterior: também passa de 1,1% para 3,5%. “Brasileiros que ajudam parentes no exterior, pagam estudos fora ou mantêm contas em outros países sentirão no bolso. O IOF de R$ 1.000, por exemplo, sobe de R$ 11 para R$ 35”, explica Emanueli.

  • Crédito para empresas: no caso de MEIs, pequenos empreendedores e negócios do Simples, a alíquota vai de 0,38% para até 0,95% fixo, com acréscimo de taxa diária maior. “Isso encarece o acesso ao crédito para quem mais precisa. Grandes empresas conseguem diluir, mas os pequenos podem simplesmente desistir de crescer.”

  • VGBL (previdência privada): aportes acima de R$ 600 mil passam a ter IOF de 5%. Emanueli alerta: “Isso desestimula investimentos de longo prazo, inclusive para pessoas da classe média que buscam uma alternativa ao INSS.”

Apesar da decisão do ministro Moraes, o tema ainda será analisado pelo plenário do Supremo após o recesso do Judiciário. Até lá, as alíquotas mais altas estão em vigor, gerando desconforto tanto no mercado financeiro quanto entre especialistas em direito tributário.

“A reação foi negativa. O mercado teme o efeito dominó, em que o Executivo passe a utilizar tributos regulatórios como instrumentos de arrecadação — o que fere princípios constitucionais e amplia a insegurança jurídica”, analisa Emanueli.

Além da questão técnica, a medida escancara a tensão entre os Três Poderes. O Congresso, que havia se posicionado majoritariamente contra o aumento, viu sua decisão ser revertida de forma monocrática. Já o Executivo tenta equilibrar as contas públicas com medidas impopulares, enquanto o Judiciário se vê no centro de um embate político-tributário.

“No fim, quem paga a conta é o contribuinte, que já lida com juros altos, inflação e um sistema tributário complexo. A elevação do IOF pode parecer pequena isoladamente, mas tem efeito cascata sobre o consumo, o crédito e os investimentos. É mais uma amostra de como a instabilidade institucional afeta diretamente a vida das pessoas”, conclui Emanueli.

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