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Os homens possuíam licença para matar mulheres no Brasil”

Dr. Gracimeri Gaviorno, delegada e especialista em segurança pública. Foto: Divulgação

“Lei Maria da Penha completa 17 anos, mas até este ano, os homens possuíam licença para matar mulheres no Brasil”, delegada e especialista em segurança pública explica a legislação

Proteger as mulheres da violência doméstica e familiar. Na segunda-feira (07), a Lei Maria da Penha completa 17 anos de existência. Um marco na luta feminina por dignidade, respeito e pelo direito básico à vida, ela é uma conquista de gerações e gerações de mulheres. No entanto, ainda há muito a se fazer. Um sinal claro disso é que, somente em 2023, em decisão histórica, o Supremo Tribunal Federal (STF) derrubou a tese de “legítima defesa da honra” em julgamentos de feminicídios no tribunal do júri.

A delegada e ex-chefe da Polícia Civil do ES, Gracimeri Gaviorno, destaca o peso histórico da Lei Maria da Penha. “Até 2006, nós não tínhamos nenhum instrumento legal efetivo para proteger as mulheres e responsabilizar os agressores. A partir da legislação, a sociedade brasileira começou a dar uma resposta ao mundo sobre os vergonhosos casos que aconteciam, e ainda acontecem, no nosso País”, diz.

Ela lembra que a Lei foi motivada por uma condenação do Brasil pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA, justamente pela demora na punição do agressor da cearense Maria da Penha Maia Fernandes. Daí, a Lei ter sido batizada com o nome da vítima.

A delegada explica que casos de agressão no contexto familiar são completamente diferentes de outras situações, como uma briga de vizinhos, por exemplo. “Quando uma mulher é agredida pela primeira vez, é só o início do seu pesadelo, porque ela vai ser obrigada a conviver com o seu agressor, no mesmo espaço físico. É uma situação muito complexa. A agressão não atinge apenas a mulher, mas toda a família, principalmente os filhos, além de impactar em outras dimensões da vida da vítima e do agressor, como no trabalho”, diz.

A delegada fala com conhecimento de causa. Em 2015, quando era chefe da Polícia Civil do ES, ela criou o projeto “Homem que é homem”, que estimulava os agressores a abandonarem ideias machistas e sexistas, reduzindo os casos de reincidência. Uma outra iniciativa foi o mapeamento dos fatores de risco de agressões, junto com outros órgãos, que ajudou na elaboração de estratégias para enfrentar o problema.

A luta, destaca, é permanente. Gracimeri lembra que o fato da Lei Maria da Penha ter sido aprovada só em 2006 é só mais um sinal de que as conquistas das mulheres no Brasil levam muito tempo. Como outro “absurdo”, ela destaca que até o ano passado as mulheres precisavam de autorização do marido para fazerem a cirurgia de laqueadura. A queda da tese de legítima defesa da honra somente neste ano é só mais uma “aberração”.

Com a propriedade e a experiência de quem encarou de frente criminosos por quase 30 anos, Gracimeri Gaviorno, não tem dúvidas: a tese da ‘defesa da honra’ era uma “licença para matar mulheres no Brasil”. Incansável na luta pela causa da proteção às mulheres, hoje ela percorre empresas e espaços público para sensibilizar a sociedade sobre o dever de proteger as mulheres brasileiras. O projeto “Maria vai com as outras” é o seu elo de mulher delegada com essa causa tão nobre.

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