Um estudo publicado em maio no periódico científico BMJ Medicine trouxe novas discussões sobre o consumo de suplementos de ômega-3 e sua relação com a proteção cardiovascular. Os achados sugerem que doses excessivas desses suplementos podem aumentar o risco de fibrilação atrial – uma arritmia cardíaca que pode levar ao acidente vascular cerebral (AVC). Esses resultados foram particularmente significativos entre participantes saudáveis, enquanto em pacientes com doenças cardiovasculares, a ingestão regular das cápsulas de óleo de peixe mostrou um efeito protetor, destacando uma discrepância nos impactos ao organismo dependendo do perfil do indivíduo.
Para chegar a essas conclusões, pesquisadores de universidades na China, Europa e Estados Unidos analisaram dados de mais de 415 mil adultos durante 12 anos, provenientes do UK Biobank – um estudo britânico que avalia as condições de saúde de meio milhão de voluntários. Apesar da relevância dos achados, os cientistas enfatizam que se trata de um estudo observacional, o que significa que não estabelece uma relação de causa e efeito definitiva. Eles ressaltam a necessidade de novas investigações antes de condenar a substância, conhecida por seus benefícios à saúde cardiovascular.
O nutrólogo Celso Cukier, do Hospital Israelita Albert Einstein, levantou algumas questões sobre o trabalho. “Não há especificação sobre as dosagens consumidas pelos participantes e nenhuma distinção das quantidades de EPA e DHA”, observa Cukier. EPA (ácido eicosapentaenoico) e DHA (ácido docosahexaenoico) são os tipos de ômega-3 mais investigados pela ciência e que compõem os suplementos de óleo de peixe. O EPA está associado à proteção das artérias, enquanto o DHA é estudado por seus efeitos na saúde cerebral, incluindo a diminuição do risco de Alzheimer e ansiedade, além de possuir propriedades anti-inflamatórias. “Mas as pesquisas são frágeis. Existe a necessidade de mais estudos antes de atestar todos os benefícios”, afirma o especialista.
Peixes de Águas Frias
A fama do ômega-3, uma gordura poli-insaturada, começou nos anos 1980. “Durante uma expedição à Groenlândia, um médico dinamarquês, Jørn Dyerberg, observou que a população local apresentava menos doenças cardiovasculares e atribuiu o fato ao alto consumo de pescados”, conta Cukier. Peixes como salmão e atum acumulam essa categoria de gordura líquida, adaptada para não congelar nas águas profundas e geladas de seu habitat. Sardinhas também contêm ômega-3, embora nadem em águas menos frias, devido ao comportamento migratório e à necessidade de energia para se locomover.
Para veganos, sementes de chia e linhaça oferecem ácido alfa-linolênico (ALA), que é convertido em EPA e DHA pelo organismo.
Cukier recomenda obter ômega-3 através da alimentação. “O estudo não revela o estilo de vida dos participantes, o que pode influenciar diretamente os resultados e a associação com a fibrilação atrial”, aponta. Fatores como tabagismo, sedentarismo e consumo excessivo de álcool podem comprometer a saúde do coração, independente do uso de suplementos.
Mesmo para quem mantém hábitos saudáveis, não se aconselha o uso de suplementos sem orientação médica ou de um nutricionista. “Ao contrário do que muitos imaginam, a suplementação sem orientação pode trazer malefícios à saúde”, alerta o nutrólogo. Exames e a análise do perfil individual são essenciais para determinar a necessidade e as dosagens corretas de ômega-3 ou qualquer outro suplemento.