Dia da Advocacia: presidente da associação dos advogados, Érica Neves olha para o futuro da profissão: “Hoje não tem como você pensar a advocacia sem tecnologia”
O Dia do Advogado, nesta sexta-feira (11 de agosto), é uma homenagem a esses profissionais tão valiosos para o País. Para se ter uma dimensão do peso da categoria, em números absolutos de advogados, só a Índia (com população bem maior) fica à frente do Brasil. O Brasil é proporcionalmente o país com mais advogados no mundo: 1 para cada 164 habitantes.
Na direção estadual da Associação Brasileira dos Advogados (ABA), Érica Neves tem um histórico de defesa da classe. Entre 2016 e 2018, ela foi secretária-geral adjunta da OAB/ES e em 2021 concorreu às eleições para a diretoria da Seccional, liderando a chapa “É Diferente – É OAB de Verdade”, que ficou em segundo lugar no pleito, obtendo mais de 35% dos votos.
Em todo universo da advocacia, ela tem um carinho especial pelos jovens. Justamente pensando nesse público, Érica criou o projeto “Desvendando o Jogo”, com o objetivo de compartilhar conhecimento e mostrar, na prática, os caminhos para uma advocacia de sucesso. Cada encontro é realizado em um escritório de sucesso diferente, e os jovens têm a oportunidade de ver de perto cases da advocacia, conversar sobre empreendedorismo e adquirir dicas práticas de quem deu muito certo na profissão.
Nessa entrevista, ela fala sobre os desafios e as tendências da profissão, representatividade feminina, OAB/ES e outros assuntos.
– O Brasil é proporcionalmente o País com mais advogados no mundo. Quais são os principais desafios da profissão hoje?
O número de advogados no nosso País é muito grande. Então, o desafio de nos diferenciarmos é muito grande também. Cada vez mais, os advogados precisam se qualificar em outras áreas complementares. Eu acredito que tem mercado para todos os profissionais que inovam e acrescentam habilidades de empreendedores aos seus conhecimentos jurídicos. A sociedade e o mercado demandam este saber multidisciplinar. Um caminho para o profissional, por exemplo, é a mediação de conflitos, considerando a morosidade da Justiça de uma maneira geral. Mas para trabalhar nessa área e ter o valor reconhecido, o advogado precisa desenvolver habilidades especificas.
– A Inteligência Artificial veio pra ficar. Como você vê a advocacia nesse contexto?
Hoje não tem como você pensar a advocacia sem tecnologia. Quando eu comecei, há mais de 23 anos, você se limitava, basicamente, ao contato físico. Agora, essa realidade é completamente diferente. Então, nós precisamos focar na tecnologia e sair na frente. Tem uma frase que eu falo sempre: se antigamente Direito bastava, hoje, pra ser um bom advogado, só o Direito não é suficiente. Eu acho que a inteligência artificial já existia em algumas ferramentas que a gente já usava sem esse nome, mas com o seu aperfeiçoamento, vamos ganhar ainda mais em produtividade e assertividade. Mas precisamos atentar que a ética do advogado deve ser a mesma. E a OAB/ES precisa ajudar os advogados com capacitações das mais diversas formas.
– Apesar de ser o grupo majoritário na profissão, as mulheres ainda não têm a devida representatividade. Por que isso não muda?
A gente sabe que as mulheres são historicamente preteridas no nosso País e também na advocacia, é um caminho mais tortuoso e isso se reflete nos espaços de poder, que naturalmente poderia dar mais visibilidade e respeito às advogadas. Vimos, recentemente, manifestações depreciativas com relação às mulheres advogadas no próprio Conselho da OAB/ES aqui no Espírito Santo. Se na nossa casa isso acontece, imagina a nossa dificuldade frente aos outros ambientes! Então, é uma luta diária para fazer valer nossa voz e representatividade.
– A OAB/ES rejeitou a proposta de paridade de gênero na eleição para a vaga de desembargador do TJES e ainda deu ao Conselho da Ordem a palavra final sobre a lista a ser enviada ao Tribunal. O que você pensa sobre isso?
Isso é um total desrespeito à democracia e à classe de advogados. A paridade de gênero é um mecanismo ainda necessário para garantir justamente a representatividade das mulheres, que estão à margem das decisões da atual gestão da OAB/ES. Manter o que temos hoje sem contribuir para equilibrar a balança é a Ordem negar o óbvio, e pior, a justificativa de faltar advogadas competentes foi um golpe nas mulheres. Inclusive, o atual presidente da OAB/ES silenciou um grupo de mulheres advogadas logo depois da decisão do Conselho de negar a paridade. Nada mais sintomático! Outro absurdo foi inverter a ordem de votação para a vaga no TJ, dando ao Conselho a palavra final na lista que será enviada ao Tribunal. É uma concentração de poder que cala a advocacia, que tira o poder da classe. Ou seja, privilegia-se um pequeno grupo, em detrimento de uma classe inteira.
– Na última eleição da OAB/ES, você teve uma votação expressiva, com mais de 35% dos votos. Como você avalia a atual gestão da Ordem?
Eu não teria problema algum em elogiar a atual gestão. Eu acredito na civilidade como forma de alcançarmos melhorias. E líderes não agem com grosseria, ameaça ou voz altiva. Mas, infelizmente, o que estamos vendo é uma administração que beneficia os amigos e pune quem pensa diferente. Aos amigos, tudo. Aos que discordam, perseguição?! É assim que deve ser? O medo desta gestão se espalha por todo o ES. Se a advocacia reconhece que eu tenho que ser a voz que enfrenta este temor para fazer uma mudança estrutural na OAB/ES, eu serei e o farei com muita honra e coragem. Esta nunca me faltou na vida.
O que temos visto, por exemplo, é que para as subseções “amigas”, o presidente dá todo o apoio necessário. Isso atinge a democracia pois os presidentes precisam proteger a advocacia que representam diante deste autoritarismo. É lamentável constatar que estamos nesse nível. Fora que a OAB/ES não age contra os desmandos contra a classe, a criminalização da advocacia criminal.