Artigo

ARTIGO – Paraíso perdido

Segundo a Bíblia Deus decidiu, certa vez, criar um jardim maravilhoso. Ele o encheu de plantas, flores, animais de todos os tipos e, acima dele, colocou o céu, com o sol, a lua e as estrelas. Eis aí uma bela descrição do Paraíso!

Eis que Pero Vaz de Caminha, nos idos de 1500, assim descreveu o nosso Brasil: “a terra em si é de muito bons ares frescos e temperados” e “em tal maneira é graciosa que, querendo-a aproveitar, dar-se-á nela tudo” – um Paraíso, pois!

Lembrei-me da descrição de Dante Alighieri, eternizada em sua “Divina Comédia”: “Sendo a terra fértil, por si ou por obra do Céu concebe e produz plantas de variado gênero e virtudes”. Acrescentou, porém, pela boca de Matelda, uma séria observação: “Por sua culpa, o homem aqui pouco demorou, transformando a vida entre prazeres num viver de desgostos”.

Não foi diferente o alerta de John Milton, em seu “Paraíso perdido”. Após descrever o Paraíso como um lugar repleto de “árvores lindas” que “ali se ostentam, de flores e de frutos carregadas”, escreveu sinistro aviso: “Sempre as melhores coisas se pervertem, por mau abuso ou não saber-se usá-las”.

Todas estas letras imortais passaram pela minha mente não faz muito tempo, quando vi pela imprensa a triste cena de brasileiros deportados dos EUA aqui desembarcando acorrentados nas mãos e nos pés.

Vi, no pátio daquele aeroporto, rastejando sob o ranger de correntes, a dignidade não apenas daqueles brasileiros, mas do próprio Brasil. Seria ele, ao fim do cabo, um Paraíso perdido?

O que nos tem faltado, afinal? Sentimento de pátria? Grandeza? Vergonha na cara por parte de sua parcela mais instruída?

Ao fundo, contemplando nossa tão bela Pátria e sua tão boa gente, eis o Padre Vieira a sussurrar uma linda oração às nossas elites: “Rei dos reis e Senhor dos senhores, que morrestes entre ladrões para pagar o furto do primeiro ladrão, e o primeiro a quem prometestes o Paraíso foi outro ladrão, ensinai com vosso exemplo, e inspirai com vossa graça a todos os reis, que, não elegendo, nem dissimulando, nem consentindo, nem aumentando ladrões, de tal maneira impeçam os furtos futuros, e façam restituir os passados, que em lugar de os ladrões os levarem consigo, como levam, ao inferno, levem eles consigo os ladrões ao Paraíso, como vós fizestes hoje”.

Acorda, Brasil!

 

Pedro Valls Feu Rosa é jornalista, escritor e desembargador no Espírito Santo

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